Lembro da história que me vem à cabeça como em flashes. Desordenada, desconexa, uma narrativa ficcional misturada a/com lembranças memorialísticas de minha adolescência.
Lembro da capa do livro. Capa escura, folhas de papel jornal amareladas pelo tempo, presas por um barbante branco. Letras muito pequenas. E, quase sem figuras... Uma tragédia.
Não li Dom Casmurro por opção. Não procurei o livro. Ele me achou.
Graças a ele, ganhei minha primeira - e não a única - caixa de chocolate. Sim, acreditem, uma caixa inteirinha.
Estava na oitava serie do Ginásio (hoje, chama-se Ensino Fundamental II) quando um menino do 1o ano do Ensino Médio me procurou para que eu fizesse o resumo do livro.
Pensei, titubei. Afinal, fora pega de surpresa. Nunca me imaginara neste ramo de atividades ilícitas. Calculei os prós e os contras. Optei pelo egoismo à ética.
Por fim, de um fôlego só respondi:
"Eufaçooresumopravocê, masvoutecobraremcholates" (Já era uma adolescente chocólatra).
E me respondeu:
"Pode ser Chokito?"
"Claro! Mas quantos? Por que os livros de Machado de Assis são muito difíceis. Terei que me dedicar muiiiiiiito". Respondi. Apreensiva esperei pela resposta.
Ele pensou e disse:
"Tá, pode ser uma caixa?"
Eu quase gritei, mas me contive e, calmamente, respondi:
"Combinado, mas tem que vir com o plástico. Ah! E você tem que pegar o livro na biblioteca.".
E assim, chegou Machado as minhas mãos.
Foi uma leitura deliciosa. Me derretia com a leitura e os chocolates.
Leitura que era interrompida para tomar água ou ir ao banheiro.
Depois de muitas e muitas horas. Terminei a leitura.
Gostei dele!
Fiz o resumo, entreguei pro menino e me consagrei - pelo menos para os alunos - como uma "profissional" em fazer resumos.
Vieram mais livros e mais chocolates.
Era certo isso? Certamente que não. Mas as leituras eram deliciosas.
Dom Casmurro pra mim tem gosto de Chokito.
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